10 abril 2011

Vandalismo organizado impõe clima de tensão em Lago-Açu

LEI DO MEDO
Depois do quebra-quebra na Câmara, integrantes da oposição recebem ameaças de morte e desistem de levar adiante pedido de CPI para investigar irregularidades na gestão Marly Sousa
POR OSWALDO VIVIANI
Município privilegiado pela natureza – especialmente por abrigar o maior lago natural do Maranhão e um dos maiores do Brasil –, Conceição do Lago-Açu (a 312 km de São Luís) tem marcado presença na mídia não pela exuberância e grande potencial pesqueiro de sua riqueza fluvial, e sim pela ação de um vandalismo organizado, cuja responsabilidade, segundo a oposição, recai sobre a prefeita Marly dos Santos Sousa Fernandes (PSL) e o pastor Mateus Pessoa de Carvalho, secretário municipal de Ação Social.
De acordo com o que denunciaram ao Jornal Pequeno o presidente do Sindicato dos Servidores do município, Lenilson Silva Marinho, e o presidente da Câmara de Vereadores, José Alcoforado de Albuquerque Júnior (PTB), a baderna que no dia 18 do mês passado resultou na depredação da Câmara Municipal de Lago-Açu foi idealizada e planejada pela prefeita e pelo pastor Mateus, com o intuito de impedir que os nove vereadores da cidade votassem um pedido de CPI para apurar irregularidades na gestão de Marly Sousa. “Foi uma ação articulada em reuniões dirigidas pela prefeita e pelo pastor”, disse Lenilson Marinho.
O quebra-quebra – praticado, de acordo com o que o JP apurou, por cerca de 200 pessoas trazidas de vários povoados de Lago-Açu – deixou como saldo a completa destruição da Câmara e seis vândalos presos, entre eles um sobrinho e um cunhado da prefeita. Cinco secretários municipais e dois vereadores ligados a Marly Sousa (Alcimar da Rocha Mota, o “Mazinho”, do PSL, e Iran Silva Vale, do PTC) foram apontados pela oposição como incentivadores do vandalismo.
Falando ao JP um dia depois dos acontecimentos, Marly Sousa negou qualquer envolvimento com os tumultos: “Eu nem estava lá, cheguei depois que já havia acontecido tudo. Eu não incentivo ninguém a nada, mas eu não mando na comunidade, que achou por bem tomar essa atitude. Se estivesse lá na hora, teria tentado convencer a comunidade a não fazer aquilo. Jamais vou querer a violência, sou uma pessoa de paz”.
Paz, no entanto, parece ser algo que só conforta a parte da população de quase 14.500 pessoas de Conceição do Lago-Açu que não questiona os atos da prefeita.
Sofrendo até ameaças de morte, os opositores da prefeita desistiram de apresentar o pedido de CPI para investigá-la. “Me mandaram recado dizendo que iriam queimar minha casa comigo e minha família dentro”, disse Lenilson Marinho ao JP.
Depois da sessão violentamente interrompida do dia 18 de março, o presidente da Câmara, José Alcoforado Júnior – também alvo de ameaças de morte – até chegou a remarcar uma outra para o dia 25 de março, mas a cancelou um dia antes, julgando que não haveria a segurança necessária para sua realização – apesar do reforço policial prometido pela Polícia Militar de Bacabal.
Na última sexta-feira (8), finalmente a Câmara de Vereadores de Lago-Açu voltou a ser palco de uma sessão ordinária, mas já sem o “risco” da instalação de uma CPI. Venceu o medo.
A reportagem do JP na Estrada esteve em Conceição do Lago-Açu, no início de março (dias antes do ataque à Câmara), e pôde constatar problemas sérios na infraestrutura da cidade, além do clima de tensão resultante do jeito de administrar truculento e intimidativo adotado pela atual gestão.
Ilustrativo foi o episódio em que o pastor Mateus Pessoa, incomodado com o fato de haver “uma pessoa estranha” fazendo fotos na cidade “sem autorização” – conforme suas próprias palavras –, foi até a Delegacia de Polícia com um grupo de moradores e exigiu de um policial que abordasse o repórter pedindo explicações sobre o trabalho que estava sendo realizado.
A resposta do repórter ao policial foi esta: “É um trabalho a favor da cidadania”. O resultado – que inclui uma denúncia séria de expedição de carteiras de pescador a pessoas (essas sim...) “estranhas” à atividade – pode ser conferido pelo leitor do JP nas próximas páginas.
Saiba MAIS
Conceição do Lago-Açu tornou-se município em 10 de novembro de 1994, por meio da Lei nº 6.199. Foi desmembrado de Vitória do Mearim.
Gentílico: lagoaçuense
População: 14.428 (Censo IBGE de 2010)
Índice de Exclusão Social: 68,34% (mais de 9.800 pessoas; Mapa da Exclusão Social, de José Lemos, 2008)
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH); 0,529 (193º posto entre os 217 municípios do MA; 25º município mais pobre)
Total de recursos federais recebidos pelo município em 2010: R$ 15,5 milhões
Total de recursos federais recebidos pelo município em 2011 (jan/fev): R$ 3,18 milhões
Total recebido do FPM em 2011 (jan/fev): R$ 1,2 milhão
Total recebido do Fundeb em 2011 (jan/fev): R$ 1,97 milhão
Prefeita: Marly dos Santos Sousa Fernandes (PSL), 39 anos, pescadora, Ensino Médio completo, natural de São Luís (MA)
Valor dos bens da prefeita declarados à Justiça Eleitoral em 2008: informou não possuir bens
Vice-prefeito: Manoel Melo de Matos (PDT), 50 anos, servidor público estadual, Ensino Médio completo, natural de Vitória do Mearim (MA)
Valor dos bens do vice-prefeito declarados à Justiça Eleitoral em 2008: informou não possuir bens
FontesTesouro Nacional, Portal Transparência da CGU e Tribunal Superior Eleitoral
Todo o esgoto da cidade é depositado no lago
Não há sistema de esgotamento sanitário em Conceição do Lago-Açu. Todo o esgoto da sede é depositado no lago que dá nome ao município e de onde boa parte dos lagoaçuenses tira seu sustento.
Tentou-se até, algum tempo atrás, construir “piscinões”, para onde o esgoto escoaria, embora continuasse sem qualquer tratamento.
As obras que viabilizariam o tal “sistema”, porém, não foram levadas adiante e hoje dois dos “piscinões” estão cobertos pelo mato no centro da cidade.







































“É um crime o que estão fazendo com o lago. Hoje tem uma abundância de camarão e peixes no Lago-Açu, mas com essa quantidade de detritos que é despejada nele todos os dias, logo, logo a natureza vai dar a resposta, negando nosso alimento”, diz Carlos da Conceição, o “Berimbau”, 23 anos, pescador desde os 10 e defensor ferrenho do lago.
Cemar considera ‘energizado’ um povoado ribeirinho que não tem luz
A luz elétrica ainda não chegou a vários povoados de Conceição do Lago-Açu. Um deles é Juçara (a 23 km da sede, à beira do lago), por onde se chega mais rapidamente (cerca de 40 minutos) de barco.
No entanto, apesar das perto de 20 famílias do povoado Juçara viverem ainda sem luz elétrica, o site da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), responsável pela implantação do Programa Luz Para Todos no estado, registra a localidade como “energizada”, em agosto de 2008.
É só consultar o site: http://www.cemar-ma.com.br/plpt/conceicaodolagoacu.htm
Janes Jorge Ribeiro Silva, presidente da Associação dos Produtores Rurais do Povoado Juçara, disse ao JP na Estrada que há seis anos a comunidade luta para trazer energia elétrica ao lugar. “Teve uma época que estava tudo certo para a energização, e a comunidade até ajudou a cavar mais de 80 buracos para colocar os postes, mas a luz elétrica nunca chegou a Juçara”, contou Janes.
Lago Verde – No povoado Lago Verde – onde também moram 20 famílias –, a luz igualmente ainda não chegou.
Francisco das Chagas Sousa, o “Filó, presidente da Associação dos Moradores do Povoado Lago Verde, informou que já foi feita a demarcação para a colocação dos postes, mas o povoado continua sem energia elétrica.
O JP na Estrada falou por telefone com o coordenador do Programa Luz Para Todos no Maranhão, Luiz Adriel Vieira Neto, e ele afirmou que iria averiguar com a Cemar o motivo de o povoado Juçara constar indevidamente, no site da empresa, como energizado.
O Mercado Municipal de Conceição do Lago-Açu é deteriorado por fora e por dentro. No dia em que a reportagem do JP na Estrada visitou o local, frango e carne de gado estavam expostos em cima nos boxes quebrados, sem nenhum cuidado com a higiene.
Pescadores denunciam fraude e falta de transparência na Colônia Z-41
Até um vereador teria carteira de pescador sem nunca haver exercido a atividade
Contando com um lago de 55 quilômetros quadrados de extensão, nada mais natural que boa parte da população economicamente ativa de Conceição do Lago-Açu se dedique à pesca. O grande lago é generoso: nos meses mais produtivos do ano – agosto a novembro –, dele são extraídas mais de 15 toneladas de pescado (camarão, surubim, pescada branca, curimatá, branquinha, bodó, liro, traíra, piranha, entre outros).
Apesar da luta desigual com os atravessadores, os pescadores lagoaçuenses sempre conseguiram sobreviver com dignidade. No entanto, nos últimos dois anos, os verdadeiros pescadores do município têm se indignado com as suspeitas de uma fraude gigantesca na entrega de carteiras de pescador, por parte da Colônia Z-41 (dirigida por Lindalva Teixeira dos Santos, irmã da prefeita Marly Sousa), a pessoas estranhas à atividade (os chamados “pescadores de aquário”).
“Para nós, que nos orgulhamos de tirar o sustento do lago, é muito ruim saber que tem gente que nunca pescou um peixe exibindo carteira de pescador. Isso nos desprestigia.Tem gente que é agricultor e tem carteira de pescador”, disse ao JP na Estrada Inácio da Conceição dos Santos, 60 – que desde os 10 anos pesca no Lago-Açu.
Assim como Inácio da Conceição, outros pescadores antigos de Lago-Açu também estão revoltados com a farta distribuição de carteiras pela presidente da Colônia Z-41. Dois deles, inclusive, até têm cargos na atual gestão da Colônia – João Batista Moreira dos Santos, 49 (presidente do Conselho Fiscal) e José Ribamar Jardim Borges, 59 (o “Zequinha Macário”, 2º secretário do Conselho Fiscal).
Tanto João Moreira como “Zequinha Macário” garantiram ao JP que o vereador Alcimar da Rocha Mota (o “Mazinho”, do PSL) é um dos “pescadores de aquário” de Conceição do Lago-Açu. “Eu mesmo já vi a carteira dele”, afirmou João Moreira.
A mulher de um fazendeiro, um vaqueiro, a dona de um comércio de material de construção e dezenas de agricultores dos povoados de Olho d’Água, São José do Aterrado e Envira também teriam recebido carteiras da Colônia sem exercerem a atividade de pescador.
“Nem nós, que fazemos parte da diretoria da Colônia, sabemos ao certo quantos pescadores estão cadastrados. Já perguntei isso à presidente Lindalva numa reunião e ela não quis responder. Da mesma forma autoritária, ela se recusa a prestar contas da Colônia e trata mal os pescadores mais antigos. Quando acontece uma reunião na qual a presidente sabe que vai ser questionada, ela convoca dezenas de mulheres nos povoados que nunca foram pescadoras para nos vaiar”, contou “Zequinha Macário”.
A reportagem do JP na Estrada foi até a Colônia Z-41 quando esteve em Lago-Açu, mas a presidente Lindalva dos Santos não foi encontrada no local. Depois disso, por quatro vezes foi tentado contato telefônico com Lindalva, por meio do telefone da Colônia (3375-1047), sem sucesso.
O JP apurou que perto de 3 mil pessoas efetivamente vivem da atividade pesqueira em Conceição do Lago-Açu, mas a Colônia Z-41 tem cadastrados perto de 6 mil pescadores. Há suspeita de uso eleitoreiro da concessão indiscriminada de carteiras.
Emissão de carteiras de pescador foi suspensa em janeiro
No final de janeiro deste ano, a ministra de Pesca e Aquicultura, Ideli Salvatti, suspendeu as entregas de carteiras para pescadores em todo o país até o dia 31 de dezembro. Além disso, 13 mil carteiras foram cassadas. A medida tem o objetivo de combater a fraude no seguro-defeso, verba concedida de um salário mínimo por mês, durante 120 dias, a cada pescador durante a piracema, época de reprodução dos peixes em que a pesca não é permitida. Em Lago-Açu, o defeso acontece de 1º de dezembro a 31 de março. Nesse período, os pescadores têm direito de coletar do lago apenas 5 quilos de pescado diariamente. Este ano o seguro-defeso atrasou em Lago-Açu, e só começou a ser pago no início deste mês.
A ministra Ideli Salvatti anunciou um novo cadastramento de pescadores artesanais para que as carteiras de pescador profissional possam voltar a ser concedidas.
Salvatti quer maior controle nos registros e na liberação do Seguro Defeso. A fraude campeia em todo o país e tem ajudado a eleger deputados federais, estaduais e prefeitos.
Com o intuito de coibir irregularidades, a ministra pediu à Controladoria-Geral da União (CGU) o cruzamento dos dados do Seguro Defeso com o cadastro do Programa Bolsa Família.
“É uma operação de saneamento efetivo, um ‘pente fino’ no registro e pagamento de benefícios”, disse Ideli Salvatti.
“Já descobrimos, por exemplo, que na cidade de Salvaterra, no Pará, que tem cerca de 18 mil habitantes, há 11 mil carteirinhas de pescador. É impossível, a não ser que [a população] já nascesse pescando”.
No Maranhão, a Polícia Federal, atendendo determinação da Justiça Federal, investigou a liberação do seguro-defeso e constatou que uma grande parte dos beneficiados não conhece sequer um anzol.
Em menos de três anos, o número de pescadores dobrou no Maranhão, saltando de 45 mil para 90 mil.
Prefeita é acusada de realizar contratos sem licitação, desviar recursos e emitir notas ‘frias’
O Sindicato dos Servidores de Conceição do Lago-Açu entregou, no fim do ano passado, aos Ministérios Públicos Federal e Estadual e à Controladoria-Geral da União um documento contendo um rol de supostas irregularidades cometidas pela prefeita do município, Marly dos Santos Sousa Fernandes (PSL).
No documento, é solicitado aos órgãos mencionados que a prefeita Marly Sousa e o vice-prefeito Manoel Melo de Matos (que também é secretário de Saúde) sejam afastados de seus cargos. Também é apontada como participante dos “esquemas ilícitos” na prefeitura de Lago-Açu a empresária ludovicence Luciene Almeida Cavalcante, dona das empresas H. Machine Comércio e Representações Ltda e LHC Comércio e Representações. Luciene é acusada de formalizar com o Município vários contratos sem licitação.
Veja as principais acusações contra a prefeita:
1. Dispensa irregular dos procedimentos licitatórios;
2. Contratação de empresas “fantasmas” sem capacidade de prestar os serviços indicados nas notas fiscais apresentadas;
3. Pagamento de serviços não desempenhados;
4. Utilização de “notas frias”;
5. Realização de saques sem os correspondentes comprovantes de despesas;
6. Apropriação indébita de valores a serem recolhidos ao INSS;
7. Desvio de recursos da Saúde e da Educação (SUS e Fundeb);
8. Atraso do pagamento dos salários dos professores municipais;
9. Desmatamento da vegetação que protege das erosões o lago que dá nome ao município;
10. Realização de pagamentos de salários apenas a alguns servidores “escolhidos” pela prefeita;
11. Descumprimento do Orçamento do Município e das devidas prestações de contas;
12. Uso de recursos que chegam ao município para pagamento de “agiotas” que emprestaram dinheiro para a campanha eleitoral;
13. Desvio de recursos de Lago-Açu para a cidade de Boa Vista (capital de Roraima), onde parentes da prefeita estariam investindo em casas e terrenos.
Outro lado – Em entrevista por telefone concedida ao JP no mês passado, a prefeita de Marly Sousa negou as acusações e disse ser favorável à instalação da CPI na Câmara para apurar as supostas irregularidades de sua gestão: “Pode apurar tudo. Se tiver irregularidades, eu estou aqui para pagar pelo que fiz”, afirmou Marly.
12 parentes da prefeita estão na folha de Lago- Açu
A administração de Conceição do Lago-Açu abriga ao menos 12 parentes da prefeita Marly Sousa – o marido, três irmãs, um irmão, quatro cunhados, uma cunhada e dois sobrinhos. Veja a relação:
1. Juarez Fernandes (marido da prefeita, secretário de Finanças);
2. Irene de Sousa (irmã, responsável pelo transporte de doentes para Bacabal);
3. Lenir Queiroz Lima (irmã, secretária de Administração);
4. Salustiano dos Santos (irmão, secretário de Esportes);
5. Carliane dos Santos (irmã, Recursos Humanos);
6. Neuma de Sousa (cunhada, faz parte da Comissão de Sindicância);
7. Roberto (cunhado, encarregado do Almoxarifado);
8. “Paca” (cunhado, responsável pelos Transportes);
9. Roberval Faria Mendonça (cunhado, chefe da oficina);
10. Edilson Fernandes (cunhado, secretário adjunto de Obras);
11. Cristiano Sousa (sobrinho, Recursos Humanos);
12. Josinaldo, “Naldinho” (sobrinho, motorista).
No povoado Centrinho, escola funciona em terreiro de umbanda
O povoado Centrinho (a 40 quilômetros da sede) é um dos mais pobres de Conceição do Lago-Açu. Fica vizinho ao povoado Olho d’Água, o maior do município.
A luz elétrica chegou ao Centrinho há menos de um ano. Lá não há posto de saúde – a opção para as 40 famílias que vivem no povoado é o posto de Olho d’Água, distante uns 5 quilômetros. Escola tem, mas funciona precariamente numa casa com teto de palha, onde também são praticados rituais de umbanda em algumas noites da semana.
A dona do “terreiro” e uma das líderes da comunidade é a lavradora Maria Benedita Freire Costa, 55 anos. Ela e seu marido, Gonçalo Costa, 79, também lavrador, foram os primeiros moradores do Centrinho, onde chegaram há 20 anos.
“Não temos nada por aqui, temos muito é sofrimento. Quando passa a campanha política, somos esquecidos”, disse Maria Benedita ao JP na Estrada.
































No povoado – onde nunca apareceu um médico, segundo os moradores –, as crianças são as que mais sofrem com doenças como diarreia e dengue. E são muitas crianças. A gravidez precoce é uma marca do Centrinho.
Antonia Francisca Freire Sousa, 20 anos, já tem cinco filhos. O primeiro deles nasceu quando Antonia tinha 15 anos. Os outros quatro formam uma “escadinha”: 3 anos, 2 anos, 1 ano e 2 meses.
Com 22 anos, a irmã de Antonia, Maria Raimunda Freire Sousa, já é mãe de três filhos, com idades de 5, 3 e 2 anos.
As duas – assim como todos os moradores do Centrinho – sempre viveram em casebres de taipa, com teto de palha e piso de terra batida. A casa de Maria Raimunda pegou fogo há dois meses. Ela e os filhos estão morando provisoriamente, com dona Maria Benedita e o marido Gonçalo.
Quebradeiras – Na estradinha de terra que leva ao Centrinho, é comum ver, pela manhã, quebradeiras de coco babaçu – geralmente com seus filhos – se dirigindo para os cocais com grandes balaios de palha.
A coleta e a quebra do coco babaçu – cuja castanha depois é vendida para os fabricantes de óleo – são as atividades mais comum das mulheres que moram nos povoados de Lago-Açu. Elas ganham de R$ 3 a R$ 5 por dia.
A lenda do surubim-gente
POR OSWALDO VIVIANI
Onde tem pescador tem história fantástica. É assim também com o Lago-Açu (“grande lago”, na língua tupi). A lenda mais difundida sobre o lago é que ele surgiu de uma grande enchente, enviada por Deus para punir a arrogância e a prepotência dos homens e mulheres que habitavam uma rica vila chamada Olinda, que ocupava, segundo a lenda, o lugar onde hoje é o lago.
A vila teria desaparecido sob as águas do Rio Mearim. Desde então, ninguém pode dizer a palavra “Olinda” quando navega no Lago-Açu, pois quando isso é feito, são escutadas vozes, discussões, rumores de festas e risos das pessoas que foram tragadas na grande cheia enviada por Deus.
Esses afogados, diz a lenda, só aparecem aos humanos em forma de surubim, um dos peixes mais abundantes do lago. Por isso, os antigos pescadores do Lago-Açu, crentes na lenda do surubim-gente, nunca matam o surubim com cacetadas na cabeça, como fazem com outros peixes. Se assim o fizerem, acreditam os pescadores, ficarão loucos para o resto da vida.
Essa história, em variadas versões, é contada pelos moradores de Conceição do Lago Açu, em conversas nos finais de tarde, quando quase todos se instalam em cadeiras nas calçadas para olhar o movimento e “prosear” com os vizinhos.
É uma cidade agradável de gente em sua maioria hospitaleira, apesar dos recentes episódios de barbárie, que o visitante logo esquece conhecendo o cais – batizado de “O Pescadão” –, vendo a molecada se divertir mergulhando no rio, e tomando umas “geladas”, atendido pela simpática Regina.
Também é inesquecível o camarão com leite de coco da Iolete, na Rua do Comércio, em frente ao Hotel Maranhão, do “Seu Dico”, bom papo nas tardes e noites típicas do Médio Mearim.
E para quem gosta de se aventurar um pouco mais, é só alugar uma “rabeta” (canoa com um motor quatro tempos na popa) e navegar, em meio ao mururu (vegetação flutuante do lago), até alguma das belas ilhas do município, como São Francisco, Cazumbá e Caga Fogo.
CENAS DE CONCEIÇÃO DO LAGO-AÇU

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